26.12.24

A correria do artista independente: desafios, criatividade e empreendedorismo

 O processo criativo é uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos artistas independentes.


A Vertices é uma das bandas que está no corre em Sorocaba

No cenário atual, ser artista no Brasil não é apenas uma questão de talento. Cada vez mais, a figura do artista independente precisa navegar por um mar de desafios, onde a criação e o empreendedorismo se entrelaçam de forma indispensável. Em Sorocaba, como em muitas outras cidades do país, artistas independentes buscam se afirmar no mercado musical e artístico, lidando com questões de produção, gestão de carreira e presença digital. Em uma pesquisa realizada em 2023 pelo Laboratório de Economia Criativa da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) do Rio de Janeiro, 12% dos artistas brasileiros afirmaram ser auto-empresários, enquanto 23% contam com empresários independentes e 58% possuem uma gestão corporativa mais estruturada para suas carreiras.

 
A pesquisa revela como o mercado musical nacional, apesar de muito dinâmico, ainda exige que os artistas sejam multifacetados, lidando com a criação de conteúdo e a gestão de sua imagem. Em Sorocaba, não é diferente: músicos e criadores locais compartilham suas histórias de esforço e superação.

A criatividade como impulso para a música
O processo criativo é uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos artistas independentes. Para o músico João Victor Amorim, que prefere se identificar como um artista da “correria”, o processo criativo exige disciplina e foco. Ele revela que, apesar das tecnologias disponíveis hoje, ainda há uma luta constante contra a procrastinação: “Quando você tem esse lapso de criatividade, você tem que ir lá e fazer, sabe? Senão, vai continuar procrastinando”. Para João, as ferramentas tecnológicas são essenciais: “antigamente, criava algo na guitarra e ficava na cabeça, agora com o computador e placas de áudio, consigo gravar diretamente no meu setup”, explica.

João é o Guitarrista de Vertices.
 
Além das ferramentas tecnológicas, João enfatiza a importância de buscar inspirações fora do seu gênero musical. Apesar de ser um grande fã de metal, black metal e hardcore, ele se permite ouvir samba, música eletrônica e até trilhas sonoras de videogames para expandir seus horizontes criativos. Essa abertura ao novo é vista por ele como essencial para o crescimento do músico: “É importante matar o ego e deixar de ouvir música só dentro do seu estilo. Quando você se permite, pode criar coisas únicas.”

A visão de João sobre o processo criativo também é compartilhada por Nick Deloier, outro artista da cena independente, que começou sua jornada musical de forma despretensiosa. “Eu comecei a compor como uma brincadeira em 2017. No começo, era só eu tocando cavaquinho e falando coisas aleatórias para divertir meus amigos”, lembra. Nick, que começou a escrever sobre amor e experiências pessoais, logo percebeu que precisava expandir seus temas. “Eu passei a escrever sobre temas mais universais, como a reflexão de uma pessoa idosa sobre sua vida”, conta, mencionando sua canção “Les Mensonges”, que fala sobre uma pessoa mais velha avaliando sua trajetória.

Nick Deloier tem uma álbum lançando, o "Camila e Eu"
 

Ambos os artistas, embora com abordagens criativas diferentes, compartilham a mesma filosofia de que a arte deve ser uma expressão autêntica, sem se prender a limitações técnicas ou estilísticas. Para eles, a criação precisa refletir suas experiências e sentimentos mais profundos.


Segundo pesquisa divulgada pela Faculdade ESPM, 76% dos brasileiros gostariam de ter seus próprios empresários

O início e os desafios na produção musical
Bruno Tardeli, proprietário do estúdio B.mix de produção musical independente que atua no cenário de Sorocaba, ele conta sobre os desafios da produção e os caminhos que percorreu até consolidar sua carreira. Ele relembra seu início, por volta de 2004, quando começou gravando jingles para empresas em parceria com o dono de uma escola de música onde dava aulas. Na época, os equipamentos eram rudimentares, muito diferentes dos setups tecnológicos atuais. “Naquela época, a gente gravava em um equipamento chamado VS, que usava Zip Drive – uma espécie de disquete grande para armazenamento”, conta Bruno. Ao longo dos anos, ele foi se especializando, chegando a abrir seu próprio estúdio em 2009 e, mais tarde, ingressando na faculdade de Produção Fonográfica na FATEC de Tatuí. Desde 2013, dedica-se exclusivamente à produção musical e à criação de vídeos para bandas e artistas.

Bruno também observa que a maioria dos artistas que chega ao estúdio não tem muita noção sobre o processo de produção musical. “A grande maioria são cantores e, geralmente, eles não têm experiência em produção. Muitos vêm pela primeira vez, principalmente pessoas que cantam na igreja e querem gravar uma música autoral ou cover.” Ele acrescenta que, como produtor, precisa ter sensibilidade para acalmar os artistas e orientá-los sobre o processo de gravação, algo que considera essencial para um bom resultado.

Empreender na música: o desafio de ser artista e empresário
Além de criativos, os artistas precisam ser empreendedores. A vida de um artista independente em Sorocaba exige que se adote uma postura empreendedora, com redes sociais, marketing digital e gestão financeira tornando-se parte do cotidiano de quem deseja alcançar um público maior.

Nick, que também é advogado, compartilha que seu trabalho lhe fornece a base para administrar sua carreira musical de forma mais profissional. “O trabalho me deu ferramentas para ver a música de uma forma mais empresarial. Considero a música como uma profissão, e estabeleço metas, cronogramas, e estratégias de divulgação”, explica.

Já Bruno destaca a importância de o produtor musical conhecer bem o artista com quem está trabalhando. “O maior erro de um produtor iniciante é não buscar referências para o artista que ele vai produzir. Música é algo abstrato, e é preciso entender o que o artista quer transmitir para conseguir chegar ao resultado desejado”, afirma.

A internet e o mercado digital: oportunidades e desafios
A presença digital trouxe inúmeras oportunidades para a música independente. Bruno recomenda que artistas novos invistam em gravações profissionais para suas músicas autorais, mas sugere que aproveitem os recursos acessíveis de gravação para divulgar seu trabalho nas redes sociais com frequência. “Hoje, com um microfone USB e um bom celular, é possível criar conteúdo de qualidade em casa. A dica é começar gravando covers para atrair um público que já conhece aquelas músicas e, assim, criar uma base de fãs.”

Nick também percebeu o impacto das plataformas digitais: “As redes sociais me ajudaram a espalhar a música e me deram dados sobre meus ouvintes, o que me ajudou a escolher qual música fazer, clipe e qual postar”, explica. Essa análise de dados é fundamental para sua carreira, permitindo que ele direcione sua música de forma mais assertiva ao público.

O futuro do artista independente em sorocaba
O cenário dos artistas independentes em Sorocaba reflete uma realidade comum no Brasil. A criação artística não é mais uma jornada solitária, mas uma empreitada que exige múltiplas habilidades. Bruno aconselha que novos artistas estudem música, empreendedorismo e marketing para se destacarem no mercado atual. “Você não precisa ser um expert, mas conhecer o básico de cada área já ajuda muito. Música, empreendedorismo e marketing são os três pilares essenciais”, diz.

Em um mercado musical cada vez mais competitivo, as redes sociais, a inteligência de dados e a gestão de carreira surgem como elementos essenciais para o sucesso de artistas independentes. No entanto, para João, Nick e Bruno, o mais importante é seguir o próprio caminho criativo e, acima de tudo, não perder a autenticidade. Como dizem todos, a música deve ser feita para quem a cria, e o resto vem como consequência.



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